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Intransigência de síndicos e condôminos e falta de responsabilidade dos proprietários de animais domésticos. Essas parecem ser as principais causas de confrontos e discussões em relação à presença de cães e gatos em condomínios. Os dois lados da moeda precisam ser observados: quem tem um bichinho no apartamento e quem sofre com os problemas causados por ele.
O que diz a lei
Para resolver qualquer conflito, em primeiro lugar, é ideal que síndicos e condôminos conheçam as legislações que regem o assunto. A lei 4.591 de 16/12/1964 (a chamada Lei dos Condomínios), em seu artigo 19 do capítulo V, diz que todo condômino tem o direito de usar de seu apartamento, segundo suas conveniências e interesses, desde que não cause dano ou incômodo aos demais moradores. O Novo Código Civil, que entrou em vigor em jan/03, praticamente repete a lei 4591, não incorporando nenhuma mudança importante. Também a lei de Contravenção Penal, em seu artigo 42, determina que quem perturba alguém, o trabalho ou o sossego alheio, “provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem guarda”, está sujeito a penas determinadas pelo Juizado Especial Criminal. Há, ainda, leis municipais que determinam, em cada cidade, um número limite de animais por residência (independente de ser casa ou apartamento) e as condições em que esses animais devem ser mantidos.
Em São Paulo, por exemplo, a lei municipal 13.131 de 18 de maio de 2001, rege que não é permitido criar, alojar e manter mais de 10 animais em residência particular, sejam cães, gatos ou cães e gatos simultaneamente. Essa lei ainda define que cabe aos proprietários cuidar para que seus animais tenham condições adequadas de alojamento, alimentação, saúde, higiene e bem-estar, criando-os em locais compatíveis com seu porte e ao abrigo de intempéries climáticas.
A convenção do condomínio
Depois dessa hierarquia de leis, vêm as convenções dos condomínios e os regulamentos internos. “Não se deve, numa convenção, proibir por proibir. Deve-se permitir a presença de animais de acordo com as leis municipais. Ao invés de brigar com a legislação, é melhor conscientizar as pessoas, pensando o condomínio como uma sociedade”, orienta o advogado Cristiano de Souza Oliveira, especializado em assessoria na área condominial. Figuras como o síndico, que acredita que o condomínio é sua propriedade, e condôminos que agem como se o prédio fosse só deles, não fazem parte da imagem do condomínio como sociedade. São comuns convenções que permitem apenas animais de pequeno ou médio porte, no prédio. Mas nem sempre essa é a melhor solução. “Um cachorro pequeno tende a latir muito mais e ser mais ativo do que um cachorro grande. Conheço até quem cria um dog alemão num apartamento de 400 m² de área. Ele não late, está muito bem cuidado e não incomoda ninguém”, exemplifica Cristiano.
Quando for feita uma alteração na convenção do condomínio, é essencial lembrar que ela deverá ser respeitada por todos, sem exceções. É o caso de convenções que exigem que se pegue o cachorro no colo, nas áreas comuns, ou que só se utilize as escadas. “E quando se tratar de um morador idoso ou de um deficiente visual que tenha um cão-guia? Todos terão que se enquadrar?”, questiona o advogado.
Em relação a gatos, é comum reclamações sobre o mau cheiro no apartamento onde vivem. “Quem tem animal em apartamento deve ter uma higiene até exagerada, além dos cuidados de não deixá-los defecar ou urinar nas áreas comuns, é claro. Os proprietários precisam se adequar, utilizando produtos como os supressores de odores, que existem no mercado”, orienta a veterinária Sonia Maria Sodré Cardoso, do setor de vistoria zoosanitária do Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) da Prefeitura de São Paulo. O Centro recebe denúncias de pessoas que criam inadequadamente seus animais, pelo telefone (11) 6224-5500. O morador receberá, então, a visita de um agente sanitário do CCZ, que dará um prazo para regularização da situação dos animais. Se dentro do prazo estabelecido o morador não se enquadrar nas exigências, será aplicada multa.
Educar para a posse responsável
Desde que o condômino crie seu animal de estimação dentro de condições ideais de higiene, os moradores devem se guiar pelo bom senso para resolver o que deve ou não ser permitido no prédio. “Tudo tem dois lados. Existe quem goste e quem não goste de bichos. Procuramos harmonizar essa questão”, explica Rosicler Baldassin, delegada e vice-presidente da seção de São Bernardo do Campo, da União Internacional Protetora dos Animais (UIPA). É comum a entidade receber reclamações de vizinhos que sofrem com o choro de cachorros, presos em sacadas de apartamentos, sujeitos ao sol e à chuva, todos os dias. “Neste caso, orientamos o proprietário de que ele está agindo errado”, conta Rosicler. Se ele não modificar a maneira de tratar o animal, a UIPA encaminha o caso para a Vara Criminal, já que todo animal é tutelado do Estado (ele pertence ao proprietário até o ponto em que ele transgride as leis).
Para ter um animal, não basta gostar de bichinhos. Como se vê, são necessárias algumas responsabilidades, como oferecer lazer, cuidar da saúde e da pelagem, alimentar corretamente. “A pessoa que fica fora do apartamento o dia todo, ou que viaja durante dias, e deixa seu animal sozinho, está fazendo-o sofrer. O isolamento não é prazeroso nunca, especialmente para o cão. Numa situação desconfortável, realmente ele vai latir e atrapalhar os vizinhos”, diz a delegada da UIPA. Comprar um cachorrinho e trancá-lo na lavanderia do apartamento (ou, pior ainda, no terraço) também não é a solução mais adequada. “Isso é um confinamento. Ou o animal pode conviver com a família ou é melhor não tê-lo”, conclui.
A educação sobre a posse responsável de animais, certamente é o melhor caminho para acabar com os problemas envolvendo animais em condomínios. O Instituto Nina Rosa - Projetos por amor à vida, uma organização sem fins lucrativos, que visa a melhoria da qualidade de vida de todos os seres, realizou um trabalho que busca justamente, a divulgação do conceito de posse responsável. São duas fitas de vídeo: “Olhar e ver” - o animal doméstico no meio urbano e a proteção animal em São Paulo (documentário que mostra a realidade da superpopulação de animais em São Paulo) e “Fulaninho” - o cão que ninguém queria -, voltado para adultos e crianças. A fita de Fulaninho, mais um caderno de brincadeiras para crianças e uma cartilha para professores e pais, foi adotada pelas escolas municipais de ensino fundamental de São Paulo, para mostrar às crianças a importância da criação consciente dos animais de estimação. “Recebemos muitas questões de condôminos que dizem: preciso doar meu animal porque no meu prédio não é permitido ter bichos. Dizemos que é permitido sim, basta respeitar certas regras”, conta Luci Mara Montejane, diretora do Instituto Nina Rosa. “Enfatizamos o compromisso do proprietário em atender as necessidades do animal”, completa.
Yara de Abreu Longo Najman colaborou na redação da cartilha de Fulaninho, e acredita que é preciso mudar a mentalidade em relação à presença de animais em condomínios, pela educação. A própria história de vida de Yara é um exemplo de como é possível conciliar animais em apartamentos. Ela mora há 30 anos num edifício ao lado do Parque da Água Branca, no bairro paulistano de Perdizes. Yara tem 10 gatos no seu apartamento e também cuida dos gatos que vivem pelo Parque. “Os gatos acabam vindo para a área comum do prédio, afinal é só pular o muro. Muitos vizinhos reclamam que eles miam de madrugada, mas não reclamam dos meus gatos. Tenho telas em todas as janelas, mantenho minha casa bem limpa e só os transporto em caixas apropriadas”, conta Yara.
Vacinação e registro de animais
Para evitar desconforto com os vizinhos, qualquer proprietário precisa estar amparado, vacinando em dia e providenciando o cadastramento de seu bichinho. O Registro Geral Animal (RGA) é obrigatório em São Paulo, para cães e gatos. O animal registrado recebe uma plaqueta com um número e deve usá-la permanentemente presa à coleira. Procure o CCZ, à rua Santa Eulália, 86, em Santana, ou uma clínica conveniada, levando RG, CPF, comprovante de residência e a carteira de vacinação do animal atualizada. Para uma maior segurança do animal, além do RGA recomenda-se também o uso de uma identificação, contendo nome e telefone do proprietário; em caso do animal se perder, aumentam as chances dele ser encontrado. Mais informações no site www.programasaudedoanimal.com.br. "
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